14 de outubro de 2009

Índices de poder de compra: MacDonalds vs. IKEA

O hambúrguer mais popular da McDonalds tem agora a concorrência da IKEA, pelo menos quando o objectivo é comparar o poder de compra da população mundial.

"O que é que um hambúrguer tem em comum com uma estante de mais de dois metros de altura? A pergunta parece o início de uma anedota, mas a resposta até é bastante séria: servem os dois para construir indicadores de análise económica.

O primeiro destes indicadores já tem 23 anos e poucos são os economistas no Mundo que não o conhecem. O índice Big Mac - o produto mais popular da cadeia defast foodMcDonalds - foi uma ideia de Pam Woodall, jornalista da revistaThe Economist, e desde que começou a ser publicado é utilizado como uma referência, muito simples mas ainda assim interessante, na comparação do custo de vida em vários países do Mundo e na análise do valor da maior parte das divisas mundiais. Tudo usando o preço aplicado pela McDonalds em todos os países em que comercializa o famoso hambúrguer.

O segundo indicador foi criado há duas semanas e é o novo rival do índice Big Mac. Outra jornalista, Kristian Siedenburg, da agência Bloomberg, achou que poderia também ser útil fazer o mesmo exercício com um dos produtos mais populares do Ikea: a estante modelo Billy, em cor branca e com 2,02 metros de altura. O objectivo do índice Billy é exactamente o mesmo que o do índice Big Mac e comprova, se ainda dúvidas houvesse, que a a cadeia de produtos domésticos sueca já atingiu o estatuto da McDonalds como marca à escala global.

Porquê estes produtos?

Tanto o Big Mac como a estante Billy reúnem características - muito difíceis de encontrar noutros bens - que os tornam ideais para serem utilizados neste tipo de índice: são vendidos em grandes quantidades numa enorme variedade de países, os seus preços são definidos pela mesma entidade para cada país e são produzidos da mesma maneira em todo o Globo.

Assim, é possível saber, de forma exacta e imediata, quanto é que um português e um americano gastam para comprar o mesmo produto, com a mesma marca, no mesmo tipo de loja e com a mesma qualidade de serviço. A partir daqui torna-se possível ficar com uma ideia de qual é, tendo como referências os hambúrgueres e as estantes, o custo de vida suportado em diferentes países. E perceber também quais as moedas que estão sobrevalorizadas ou subavaliadas. Cruzando com outros dados, como o salário médio por hora trabalhada, fica-se ainda a saber quantas horas é preciso trabalhar em cada país para poder comprar um Big Mac ou uma estante Billy.

O problema, claro, é que a análise de apenas um produto isoladamente deixa muita coisa por explicar. E por isso, não é surpreendente que, apesar de todas as características que têm em comum, os dois índices acabem por chegar a resultados bastante diferentes.

Se no caso da estante Billy, os preços mais baixos se encontram nos Emiratos Árabes Unidos, logo seguidos de vários países europeus, como Portugal e a Espanha, quando se verificam os dados obtidos com o Big Mac, os preços na Europa figuram entre os mais altos, ao passo que os valores mais baixos estão em países asiáticos como a China.

O índice Big Mac, a ser usado desde 1986, tem revelado ser um indicador muito útil, especialmente no que diz respeito à análise do valor relativo das divisas. A lógica seguida é a de que, se depois de convertidos em dólares, os preços praticados no Big Mac são mais altos num país do que no outro, então, isso significa que a divisa de um país está sobrevalorizada nos mercados cambiais face à outra. O índice Big Mac tem vindo a apontar nos últimos meses para uma sobrevalorização do euro face ao dólar e, no sentido contrário, para uma subvalorização do iuan, a divisa chinesa, confirmando aquilo que outros indicadores, mais complexos, têm vindo a mostrar.

Outros dados

Os dados obtidos com a estante Billy não permitem chegar à mesma conclusão. Mas será que estão errados? Ou simplesmente servem para analisar outro tipo de realidade. A autora do novo índice Billy dá algumas explicações para as diferenças nos resultados dos dois índices. "Apesar de ambos os produtos servirem para comparar diferentes níveis de preços em vários países, as estantes Billy não são, como é óbvio, compradas com tanta frequência como os Big Mac. Além disso, os preços do Ikea não são tão flexíveis, os consumidores alvo são bastante diferentes e os custos de produção e distribuição podem ser influenciados por diferentes factores", afirma Kristian Siedenburg.

Seja como for, o facto de um produto Ikea ter sido escolhido para rivalizar com a McDonalds é a última prova do fenómeno que a empresa sueca constitui na economia globalizada. A empresa fundada por Ingvar Kamprad em 1943 já está instalada em 37 países com mais de 300 lojas. Da Europa aos Estados Unidos, passando pelo Mundo islâmico e por Israel, o grupo IKEA tem uma presença verdadeiramente global, que permite ao seu fundador estar no quinto lugar do ranking dos mais ricos do Mundo da revistaForbes.

Tal como os hambúrgueres da McDonalds, os móveis do IKEA são hoje reconhecidos pela maioria da população do Mundo desenvolvido e, por isso, o índice criado por Kristian Siedenburg pode aspirar a que, um dia, possa ser pelo menos usado como complemento do seu rival Big Mac."

in Jornal PÚBLICO online 27/9/2009.


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